O Programa Clandestino traz um pouco da cultura do Tango. Já está no ar este programa especial.
Após a programação habitual na Rádio Eixo, ele ficará disponível na plataforma Soundcloud:
A seguir oferecemos a transcrição das falas explicativas do episódio:
Nota 1
Está começando, neste momento, mais um Programa Clandestino aqui na Rádio Eixo. Lembrando que este projeto é realizado com recursos do Fundo de Apoio à Cultura do DF, o FAC DF. Nesta temporada do Clandestino 2024, recebemos esse apoio importante.
E desta vez, o nosso Programa Clandestino vai tratar de uma expressão cultural, de um ritmo, de uma cultura, de uma dança fundamental no nosso continente, e no mundo talvez também. Trata-se do tango. Realmente, o Programa Clandestino devia ter tratado do Tango há muito tempo, mas realmente não é um assunto simples. Tem informação demais, tem coisa demais para falar sobre o Tango, e a tarefa não foi simples. Assim, esse nosso programa, que já é o programa de número 129, foi finalmente dedicado ao Tango. Sobre esse tema tem livros e livros, documentários e documentários, pesquisas e pesquisas demais. Então vamos tentar, de forma bem modesta e humilde, dedicar essas nossas duas horas a dar uma perspectiva do Tango.
Mas certamente, se há algum ouvinte especialista sobre o assunto do Tango achará alguns erros, achará algumas lacunas, mas vamos tentar fazer esse apanhado rápido, pegar um pouco da história do Tango, pegar desde o seu início e chegar até os nossos dias numa viagem, talvez um pouco apressada, mas esperamos que seja respeitosa. O Tango nasce basicamente nos bairros mais populares das grandes cidades do Rio da Plata. Geralmente algumas vezes se acostuma a reduzir um pouco a história do tango, à cidade de Buenos Aires, mas na verdade é um fenômeno no qual devemos incluir a cidade de Montevideo e, em geral, os grandes centros urbanos do Rio da Plata.
O tango surge então entre as classes mais populares, numa mistura realmente bem interessante e bem rica entre o que eram os migrantes internos da Argentina, onde se encontravam os camponeses, o famoso gaúcho habitante do campo, e onde tinha uma importante componente de pessoas negras e os imigrantes europeus, italianos, poloneses e judeus. Essa mistura é interessante, sempre ao redor do porto, sempre nos bairros mais complicados, nos bairros mais conflitivos, onde chegavam os imigrantes, muitas vezes sem trabalho, muitas vezes numa condição econômica bem precária e na sua maior parte homens, que eram a maior parte dessa mistura. Entre a população homens começa a surgir uma interação extremamente interessante, começa a se misturar, começa a se fazer uma música, juntam-se então para fazer tango, para cantar, tocar e dançar tango.
O Tango que, como palavra aparentemente, é de origem africana, assim como o ritmo básico e assim como a parte mais importante da dança, juntam-se com algumas raízes europeias da França, da Inglaterra, do centro da Europa, como a contradança e outros tipos de dança que fazem referência ao que já acontecia em Cuba com a habanera, que não era outra coisa que uma interessantíssima mistura da base musical europeia junto com o ritmo africano e junto com as formas de dançar africanas que desafiavam um pouco as formas de dança europeias, como a valsa, que era uma dança sim de casal, mas que mantinha uma distância muito discreta, já a componente africana deu aquela sensualidade à dança, que é uma das marcas fundamentais da dança no Tango, como imaginamos, todos vocês saibam.
Vamos então começar nesse nosso primeiro bloco, escutando algumas músicas de Tango bem antigas. Aliás, a gente começou escutando o Tango La Cumparsita, que talvez seja consenso ser considerado o Tango mais conhecido, mais popular, o Tango mais famoso do mundo, que foi composto pelo músico uruguayo Gerardo Matos Rodríguez. Mas nesse nosso primeiro bloco vamos escutar alguns tangos bem antigos, aliás, vamos começar escutando a música Bartolo e a música Cara Sucia, que estritamente são considerados como proto-tangos. E continuaremos escutando duas figuras fundamentais da história do tango, como Higinio Cazón com música El Taita e Gabino Ezeiza com a música El Cochero, os dois músicos e compositores afro argentinos. Isso é muito importante porque a componente africana do Tango é fundamental e muitas vezes apagada, muitas vezes as pessoas acham que o Tango seria uma música mais de imigrantes europeus, mais branca, quando realmente essa componente africana foi extremamente importante.
E continuaremos escutando outras músicas clássicas desse primeiro período do Tango, estamos falando do finalzinho do século XIX, começo do século XX. É uma época de consolidação do Tango como a gente o conhece e, para finalizar esse nosso bloco, vamos escutar duas peças bem importantes, como são a música Don Juan, que seria a primeira gravação, aparentemente, onde aparece o bandoneon e a música La Sonámbula onde aparece o primeiro solo de bandoneon- Isso porque naquela época é a época de consolidação do formato do Tango, que no começo eram formações bem simples, quase espontâneas, sem partitura por exemplo, mas vai se consolidando a formação da orquestra de Tango, dentro das quais talvez o instrumento mais conhecido, mais importante, mais óbvio e o bandoneon. Vamos então começando esse nosso Programa Clandestino dedicado a essa importantíssima expressão cultural do sul do continente e que se tomou o mundo, o Tango. E como sempre aqui o programa clandestino da Rádio Exo.
Nota 2
Continuamos nosso Programa Clandestino dedicado à cultura do Tango. Como já falamos, teria muita coisa, muito material para falar sobre o Tango aqui. Modestamente, humildemente, vamos tentar fazer um apanhado rápido, embora que esperamos respeitoso dessa importantíssima cultura do sul do continente. Vamos continuar avançando um pouco no tempo, escutando alguns outros clássicos, passando um pouco pela história desse gênero. E vamos começar por uma figura fundamental do Tango, talvez a figura mais reconhecida do Tango, talvez a figura mais escutada e que até hoje continua sendo escutada. Inclusive, tem aquela piada, tem aquele ditado que diz que ele canta cada vez melhor, embora tenha ido morar no bairro de cima há muito tempo. Trata-se, obviamente, de Carlos Gardel.
Nós tínhamos muita coisa para falar, daria para fazer um Programa Clandestino só para ele, talvez seja uma boa ideia, mas vamos dizer que entre todas as suas façanhas, digamos, uma das mais importantes é ter sido o criador, ou talvez o protagonista, do que seria o Tango canção. Isto é, o Tango cantado, já que no começo era talvez mais importante o Tango cantado, muito dado para dança, mas ele inaugura a nova tradição e é talvez um consenso entre os pesquisadores, considerar que a música Mi Noche Triste, cantada por ele obviamente, possa ser considerado como o primeiro Tango canção.
Vamos também escutar dele outro super clássico da música Tango que é Por una cabeza, dessa música a gente pegou um trechinho extraído do filme também chamado Por una cabeza, isso para lembrar, para fazer referência à importância que teve o cinema no Tango. O Tango não só era uma dança, era uma cultura, mas era também um gênero musical que entrou no cinema. Muitas vezes os atores, os cantores de Tango eram conhecidos também pela sua aparição no cinema. O Carlos Gardel, nos deixou talvez muito jovem num acidente aéreo na cidade de Medellín, na Colômbia, isso é importante também ser falado porque na Colômbia, como em muitos países hispano-americanos, o Tango se espalhou rapidamente, e entre eles realmente Carlos Gardel era uma superstar que a gente às vezes tem dificuldade em entender e imaginar.
Vamos continuar esse nosso segundo bloco, então, escutando umas músicas um pouco mais recentes do segundo período do Tango, saindo um pouco da velha guarda que seria esse primeiro período, esses proto-tangos, aquelas gravações que a gente escutou inclusive com uma fidelidade um pouco low-fi. Vamos escutar, continuar escutando, alguns clássicos como o inesquecível, Cambalache, por exemplo, e lembrando que nesse ponto estamos falando de uma fase do tango totalmente diferente, a primeira onde era estigmatizado, onde era considerado uma música de, entre aspas, delinquentes, entre aspas de malandros.
Estamos falando aqui de grandes orquestras já reconhecidas, o Tango já tinha ido para a Europa, para Paris, onde tinha sido totalmente reconhecido como acontece muitas vezes com as nossas culturas, quando são reconhecidas em outros lugares, nós mesmos percebemos a sua importância. Já tinha voltado de Paris, se dançava nos grandes salões, já aparecia na rádio, já aparecia no cinema, e começava a ser considerado como parte importante da cultura nacional dos países do Sul, Argentina e Uruguai. Devemos lembrar que no começo, o Tango, nascendo nos bairros populares, nos bairros mais complicados, ele era dançado nas casas de prostituição. Por isso, tem aquele mito que diz que no começo o tango era somente lançado entre homens. Na verdade, ele era dançado entre homem e mulher nessas casas de prostituição. Lembramos que era uma população basicamente masculina, sendo assim, nessa época inicial, as mulheres, entre aspas, de boas famílias não deveriam dançar Tango, essa música que era associada com a prostituição. Mas agora estamos falando de outra época, onde o Tango inclusive fica mais glamoroso e finalmente aceito pelas elites. Vamos então continuar esse segundo bloco, escutando um pouco dessa época da idade de ouro do Tango, onde ele não só é conhecido na Argentina, mas sai da Argentina, do Uruguai, vai para a Europa, vai conquistando toda a América e vira um fenômeno praticamente global. É o programa Clandestino, como sempre, na Rádio Eixo.
Nota 3
Vamos começando o nosso terceiro bloco do Programa Clandestino dedicado ao Tango, já chegando um pouco mais nos nossos dias. Nos anos 50, 60, o Tango entrou um pouco em decadência, praticamente pela influência de novos ritmos, dos novos ritmos dos jovens, como o Rock e outros ritmos do tipo, que faziam com que o Tango para os jovens fosse música de velhos, eles queriam escutar outras músicas e também pela influência da música folclórica, da música criolla da Argentina. Mas o Tango sobrevive, o Tango vai ganhando sempre novos seguidores, apesar da situação.
Vamos começar esse nosso terceiro bloco, escutando uma música realmente bem particular, já que se trata de um compositor russo, desculpe a pronúncia, Pjtor Leschenko. Que nos traz um Tango russo, e não é o único caso de Tango composto na Europa e em outros lugares do mundo, o que demonstra também que o Tango vira um pouco universal. Mas o tango passa um pouco por esse impasse, por essa necessidade de renovação e aqui aparece talvez outra figura importantíssima, desculpem os puristas, que talvez alguns consideram tão importante como Carlos Gardel que é Astor Piazzolla, que foi o encarregado de levar o Tango do século XX para o século XXI. Talvez foi ele o encarregado de dar uma nova sonoridade e fazer o renascimento do Tango, de fazer com que o Tango não continuasse imitando os cânones antigos, os cânones tradicionais e conseguisse fazer novos ouvintes, conseguisse explorar novas sonoridades. E levá-lo para novos públicos. Isso acontece praticamente com a música Adiós Nonino. Essa música é fundamental porque realmente mudou a sonoridade e incluiu elementos de jazz e outros elementos de composição que realmente causaram a fúria e alguns puristas, mas levaram o Tango para outro patamar.
Vamos escutar obviamente a música Adiós Nonino, mas vamos escutar também a música Balada para un loco, que tem uma história bem interessante, já que ela foi apresentada num festival de música popular lá na Argentina, em Buenos Aires. Foi apresentado como um Tango e houve uma grandíssima polêmica para determinar se se tratava de um Tango ou não. Ao que parece, as regras do festival foram mudadas para a música do Piazzolla não ganhar. O Tango se transforma, se consolida, vai no mundo todo, a gente encontra academias e danças de Tango em muitos países do mundo, e ele inevitavelmente se mistura com outras sonoridades e se mistura com o gosto dos jovens que começam a experimentar com o Tango.
Esse é o nosso último bloco, então além das músicas de Astor Piazzolla, vamos escutar algumas músicas e novos artistas que começam a misturar o Tango com música eletrônica, que começam a misturar o Tango com o Rock, fazendo algumas misturas realmente extremamente interessantes, como a Nacha Guevara que traz uma versão rock do tango Mis Buenos Aires e o grupo Otros Aires que faz uma versão do tango clássico Milonga Sentimental com várias referências de música eletrônica e, como não poderia faltar, o grupo Bajo Fondo que mistura também várias sonoridades mais modernas e tem entre os seus membros o importantíssimo Gustavo Santolaja trazendo essa música Sonido Nativo del rio, mistura um pouco com elementos do hip hop. Também teremos o grupo Tanghetto, experimentando com a música original de Sting, Englishman in New York. E, falando de misturas, evidentemente o ouvinte deve estar pensando onde é que está o Gotan Project, que foi um dos pioneiros de misturar a sonoridade do Tango com as sonoridades eletrônicas, a gente não incluiu porque já fizemos bem um Clandestino completo, as suas duas horas completas, para o grupo do Gotan Project.
Então vamos fechar esse nosso bloco e esse nosso Programa Clandestino escutando um pouco de experimentações. Um pouco de mistura do Tango do século XXI, um gênero renovado, um gênero que se reinventa, mas que mantém um olho nas tradições. Quem dança Tango, quem pratica o tango, sempre volta às tradições, sempre respeita um pouco os ancestrais. É o nosso programa Clandestino dedicado à música do Tango, dedicado ao gênero do Tango, à dança do Tango, à cultura argentina e uruguaia, porém global, do Tango. É, como sempre, o Programa Clandestino aqui da Rádio Eixo.
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