
ROTEIRO
VINHETA DE ABERTURA – campanhinha toca três vezes
VOZ DE ABERTURA – PAOLA – “A RÁDIO EIXO APRESENTA EIXOENCENA”
BG - “Mambembe” Chico Buarque (versão Chico e Roberta Sá) trilha sonora de fundo. Rubrica para o sonoplasta (Colocar o som da música tal como pano de fundo da voz do narrador... bem baixinha)
SONOPLASTIA – DUAS CAMPANHINHAS
LÍLIAN
Narrador (rádio novela) – Olá ouvintes, este é o programa EIXOENCENA. Uma série de Rádio-Teatro que fará ao longo deste ano, uma homenagem ao Teatro Brasileiro do séc. XIX e ao Teatro de Brasília. Eu sou LÍLIAN ALENCAR e o nosso dramaturgo deste mês é “FRANÇA JÚNIOR”. O elenco do programa EIXOENCENA é formado por mim, pelo ator TIAGO DE CARVALHO, pelo atriz KARLA CALASANS, e grande elenco. Neste QUARTO e último programa temos uma cena da peça: “O TIPO BRASILEIRO”
BG: Começa a tocar com Carmem Miranda “Disseram que eu voltei americanizada”
Narrador (rádio novela) – Nesta peça de França Júnior, iremos nos encontrar com a ideia: O que é a identidade brasileira? Quem somos? Na cena há um diálogo do senhor Teodoro e sua filha Henriqueta que recebem o senhor Henrique, apaixonado pela moça, e defensor do Brasil. Este vai ter um embate homérico com o pai da moça, pois Teodoro é apaixonado pelo gosto estrangeiro, vamos começar com o senhor Teodoro:
SONOPLASTIA: UMA CAMPANHINHA
TEODORO (TIAGO) – imitando voz de americanoSenhor Henrique, o homem ainda não obteve o privilégio e no entretanto já começam a fazer-lhe uma guerra de morte com todos os confeiteiros e botequineiros da cidade. Que país! Não se pode ser estrangeiro aqui!
HENRIQUE (KARLA) espantado – Ouvintes este senhor é brasileiro e está puxando este sotaque americano. O que é isso?! Para Teodoro Engana-se, Senhor TEODORO PAIXÃO, brasileiro é que aqui não se pode ser.
TEODORO - Aposto que vem já com o lugar comum favorito: tudo está monopolizado!
HENRIQUE – O senhor é mesmo brasileiro?
TEODORO – Brasileiríssimo, do Oipaque ao Chuí...
HENRIQUE – E que sotaque é este?
TEODORO – Ora senhor Henrique estou treinando para a chegada de nossos amigos estrangeiros.
HENRIQUE - Ainda não disse nada sobre estar monopolizando a questão.
TEODORO - Se tudo está monopolizado é por inteligências superiores às nossas, por ilustrações que nunca havemos de ter..
HENRIQUE - E pelos inúmeros charlatães que cá vêm engodar-nos com nossos cajus, bananas, castanhas..
TEODORO – Vou te lembrar de uma coisa Senhor Henrique, que está em minha casa, in my house...
HENRIQUE - O Senhor Teodoro é o tipo do brasileiro. Não há país nenhum do mundo que não tenha orgulho de suas glórias, de suas instituições e de suas coisas. Desde a soberba Roma onde o súdito dos Césares dizia cheio de justa satisfação - civis romanus sum, até ao canto mais recôndito do globo, o patriotismo tem sido a virtude saliente de todas as classes sociais. O brasileiro desprestigia-se a si próprio, em todos os lugares, a cada momento, nas coisas mais insignificantes da vida e nos maiores acontecimentos dela.
TEODORO - Discursos! Discursos! Speechs speechs
HENRIQUE - Apesar de já me ter observado que está em sua casa, peço-lhe que me ouça por alguns instantes. Saímos do colégio ignorando a nossa história; sabemos onde fica a França, a Inglaterra e a Rússia, mas raros são os que podem dizer os nomes das cidades principais do Brasil.
TEODORO – Oh my God!
SONOPLASTIA: coloca um “Oh my god” com várias vozes
HENRIQUE - No parlamento ninguém cita os luminosos precedentes do nosso passado, roídos pelas traças em solitários arquivos; em compensação porém invocam-se ali, a cada passo, as práticas inglesas
TEODORO – Jesus Christ!
SONOPLASTIA: coloca um oh JESUS CHRIST com várias vozes
HENRIQUE - ... e levantam-se soberbos, sobre pedestais ao senhores Lord Derby, Lord Pitt, Lord Thiers, Lord Guisot e a tantos outros luzeiros do velho mundo. A imprensa desprestigia os nossos ESCRITORES: quando uma vocação surge, ébria de esperanças, ou morre ignorada, tiritando no gelo da indiferença, ou sucumbe aos golpes da crítica invejosa e mordaz.
TEODORO – Oh Fuck!!!!!
SONOPLASTIA: coloca um OH FUCK com várias vozes
HENRIQUE - Não há ninguém honrado no fastígio do poder: os estadistas assumem o governo, cheios de fé, e descem dos conselhos da coroa, feridos na probidade e trazendo no coração os gérmens da descrença. Se a dignidade da nação empenha-se em cruenta guerra, amesquinhamos as nossas vitórias perante o estrangeiro.
TEODORO – CRAZY CRAZY!!!!!
SONOPLASTIA: coloca um CRAZY CRAZY com várias vozes
HENRIQUE - mandando escrever em todos os jornais do Império que nos batemos com inimigos esfaimados, maltrapilhos e covardes. Não é tudo ainda, os guerreiros da rua do Ouvidor dão planos de campanha e, desrespeitando a dignidade do pavilhão nacional, abatem hoje o general que elevaram ontem, para elevarem outro que hão de abater amanhã.
TEODORO – Shut-up! Você está provando, meu amigo, que é um brasileiro ufanista e exagerado, tem discursado maravilhosamente, mas estamos fartos de discursos, queremos a realidade.
HENRIQUE - A nossa indústria...
TEODORO (Zangado) – Ainda continua?
HENRIQUE - A nossa indústria definha, humilhada por nós mesmos. O brasileiro que monta um estabelecimento industrial trata logo de ocultar a nacionalidade dos seus produtos em pomposos rótulos estrangeiros.
TEODORO – Oh my God de novo!
SONOPLASTIA: coloca um oh my god com várias vozes
HENRIQUE - O senhor, por exemplo, detesta a cerveja brasileira; no entretanto vai beber, por dez tostões a garrafa, a cerveja que o rótulo afirma ser inglesa e que poderia saborear pela módica quantia de uma pataca.
TEODORO – Jesus Christ de novo!
SONOPLASTIA: coloca um oh JESUS CHRIST com várias vozes
HENRIQUE - Envergonhamo-nos das tradições as mais populares que todos os povos civilizados respeitam como legados preciosos do passado. Vamos de dia em dia perdendo o tipo na família, nos hábitos, nos costumes, e finalmente até já começamos a prostituir a própria língua que falamos!
TEODORO – Oh Fuck de novo!!!!!
SONOPLASTIA: coloca um OH FUCK com várias vozes
HENRIQUE - CRAZY CRAZY CRAZY NADA SENHOR, AQUI É LOUCO, LOUCO, LOUCO. O Senhor Teodoro é a personificação eloqüente do que acabo de dizer. Mas o que é isto?
TEODORO - É verdade. Ora, ouça. Hoje temos a "Grande exposição de camelos da Costa d'África. Entrada $1000."
HENRIQUE - Eis aí ainda uma prova do nosso pouco amor à pátria, e do maldito estrangeirismo que vai tudo invadindo. Camelos da Costa d'África! Este país tem muito bons camelos, pode dizê-lo com orgulho, não há necessidade de ir mendigá-los ao estrangeiro.
TEODORO ironia - Lá isso tem, é a pura verdade. Camelos aos montes, como jegues, burros, papagaios...
HENRIQUE - Talvez militasse no ânimo do expositor uma razão muito poderosa de economia.
TEODORO - Qual é?
HENRIQUE - É que o camelo da Costa d'África pode passar muitos dias sem comer; os camelos do Brasil são os que mais comem.
TEODORO Ouvintes estamos diante de um Patife! Henriqueta venha cá, my daugther, Despeça-se deste sujeito: não quero vê-lo mais aqui. Não se casará com ele.
HENRIQUETA (LÍLIAN) - Mas meu pai...
TEODORO – Não tem meu pai, papi, papito, father Dad. Sinto não poder ouvi-lo mais, EU tenho que fazer. Ah! é verdade, aproveito a ocasião para dizer-lhe que minha filha vai se casar com o Mr. John Read.
BG: Começa a tocar com Carmem Miranda “Disseram que eu voltei americanizada”
KARLA
A peça “O tipo brasileiro” é uma comédia de costumes na qual França Júnior se coloca diante das famosas crises de identidade nacional após meio século da Independência do Brasil. No texto, um brasileiro apaixonado vê sua amada ser entregue por dote a um inglês e faz junto ao pai da moça uma análise do gosto pelo estrangeiro, maior que o gosto pela própria nação, esta crise como se resolverá? Leiam ouvintes leiam...
TIAGO
A peça vai se desenrolar como na famosa canção interpretada e gravada por Carmem Miranda com O SEGUINTE questionamento: O que é melhor? O Brasil e sua cultura diversa e seus problemas mil, ou devemos assimilar o gosto estrangeiro e suas qualidades principalmente frutos da evolução capitalista? Não há resposta definitiva, pois estamos entre o ridículo da assimilação estrangeria a qualquer custo e a visão reacionária de que só presta aquilo que é originalmente nacional, sobre a comicicade e o humor. Viva a Antropofagia!
LILIAN
Aventuras, guerras e pobreza estão entre as principais causas do fenômeno imigratório que tomou conta do Brasil de França Júnior, nos finais do séc. XIX. Não foram necessariamente os ingleses elogiados pela personagem da peça de nosso dramaturgo, nem mesmo o sonho americano que fez de Carmem Miranda, a portuguesa, o pivô da polêmica sobre a nossa brasilidade. É que somos um povo de extrema adaptação e aceitação, pagamos o ônus e recebemos o bônus desta história social.
KARLA
Nós no Brasil temos a tese de nossa miscigenação e antropofagia como base de aceitação das inúmeras culturas. Basta ver que japoneses, árabes, alemães e italianos, os quatro maiores grupos de imigrantes dos 1800, que tomaram conta da formação da gente brasileira, influenciaram pesadamente o séc. XX após o desembarque no Brasil do séc. XIX. E tudo isso, para além do clichê de já termos assimilado o que veio do branco europeu, o que estava do indígena e o que nos chegou do homem de África.
LÍLIAN
E assim encerramos o QUARTO E ÚLTIMO episódio da nossa série: O Teatro de FRANÇA JÚNIOR. No próximo mês estaremos com o teatro de MACHADO DE ASSIS. Agradecemos a paciência da querida e do querido ouvinte por terem se colocado com atenção no nosso programa EIXOENCENA.
TIAGO
O programa EIXOENCENA é parte do projeto RÁDIO TEATRO, OS FUNDADORES DO TEATRO BRASILEIRO E O TEATRO DE BRASÍLIA realizado com recursos do FUNDO DE APOIO À CULTURA DO DISTRITO FEDERAL e como se diz no bom e velho teatro fiquem bem e
OS TRÊS ATORES JUNTOS: “MERDA PRA TODOS”
BG – Volta “Mambembe” de Chico Buarque na versão original para encerrar o programa
Para ouvir acesse: https://soundcloud.com/radioeixo/franca-jr-pgr-04-o-tipo-brasileiro?in=radioeixo/sets/eixoencena
Comments